segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Soutor

Os euros e a sua dança no nosso país são coisas às quais não tiro importância. No entanto, Portugal está a precisar de mais do que apenas uma mudança económica. Está a precisar de uma mudança de mentalidades.
Porque, ao fim e ao cabo, tudo acaba por girar e ser girado por mentalidades e, enquanto não se fizerem umas afinações às nossas, as coisas más continuarão a ser más.

Em pleno século vinte e um, uma pessoa com bata vestida, acompanhada por um médico, é apresentada a outro médico como sendo um colega "lá do trabalho". O segundo médico trata o colega com todos os sorrisos e simpatias que manda a camaradagem no local de trabalho.
Até que o senhor descobre que o tal colega de bata não era um médico, mas sim um técnico... A partir daí a bata branca passou a ser um manto de invisibilidade e qualquer tipo de conversa passou a ser tida de cima para baixo.

Em pleno século vinte e um, ainda há, de forma generalista, a mentalidade do soutor lá em cima, e do resto lá em baixo. A culpa não só de uns, a culpa não é só de outros. A culpa é de ambos - dos que se deixam subir, dos que se sentam no escorrega, dos que empurram para cima e dos que vão empurrando para baixo.

Que se mudem as mentalidades! Que se pense no equilíbrio!
Que há gente com lugares mais importantes do que os outros, isso é facto. Mas por trás de qualquer bata, uniforme, vestido ou falta de roupa, está uma pessoa. 

10 comentários:

  1. No meu primeiro emprego, o boss tinha a mania de tratar por doutor quem tinha curso superior e uma das primeiras coisas que lhe disse quando me apercebi disso foi que não era mais do que ninguém por ter um canudo!

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    1. Estou a ver o estilo. O problema é quando se começa a criar um ciclo e mesmo aqueles que sabem que não são mais do que ninguém por terem um canudo, às vezes vêm-se obrigados a assinar com Dr. só para terem as coisas feitas decentemente. É triste, mas é a realidade.

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  2. Notei isso no meu primeiro estágio. Tinha saído do gabinete da Consulta da Saúde da Mulher com um enfermeiro e encontrámos um delegado de informação médica que cumprimentou o enfermeiro e me ignorou completamente. A dada altura, já depois de dois ou três minutos em que fui completamente ignorada, o enfermeiro resolveu dizer que eu era estudante de medicina de Lisboa, que estava ali a fazer um estágio de um mês. 'Ai desculpe, nem a cumprimentei! Assumi que era estagiária de enfermagem!' (Tenrinha como era limitei-me a dizer 'Bom dia'. Se fosse hoje perguntava se a boa educação depende da profissão das pessoas com quem se está)

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    1. Estagiários de enfermagem de facto têm uma vidinha lixada, pelo que vou vendo.
      Eu noto uma diferença enorme de tratamento quando vou a sítios mais administrativos com ou sem bata.

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  3. Apesar de tudo acho que isso está a começar a mudar. Pelo menos na minha geração (e na geração daqueles que são internos agora e mesmo dos especialistas há 2/3 anos) não se nota tanta arrogância e há mais a noção do trabalho de equipa. Pelo menos quero acreditar que sim.

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    1. Honestamente, não sei. Gostava de acreditar que sim, mas vê-se tanta gente nova com o nariz empinado...

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  4. Que tristeza...o mais importante são as acções duma pessoa, o seu coração, a sua integridade, títulos são isso mesmo, títulos...*

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    1. Exactamente. Um curso não faz de ti uma melhor pessoa, o problema é que há quem ache que um curso faz de si, não só melhor pessoa como mais pessoa!

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  5. Um post velhinho... mas eu entrei, fui lendo e decidi comentar este porque me toca. Sou estudante de medicina, estagiária (6º ano) e, se por um lado partilho de tudo o que aqui foi dito, por outro sinto, diariamente, que, às vezes, quem se queixa de discriminação é o primeiro a discriminar. Todos os dias digo bom dia a toda a gente no local de estágio onde me encontrar, não raras vezes, sou ignorada por enfermeiros, técnicos e até mesmo auxiliares e olha que vou de bata branca, cartão identificativo e até estetoscópio, quando se justifica. O tratamento é bastante diferente quando passo com o médico, nessa altura já é doutora para aqui e para ali. É, de facto, um problema de mentalidades, não apenas dos que se deixam contagiar pela mania e soberba do canudo, mas por aqueles que insistem em prestar vassalagem aos primeiros pela frente e por trás é o que se sabe. Também conheço alguns que muito criticam mas cujas acções apontam para uma realidade bem diferente, no sentido de que se estivessem na posição do médico fariam igual ou pior. É, na verdade, uma questão de mentalidade do povo, infelizmente generalizada. Para mim, futura primeira médica da minha família, assumidamente sensível e humanista, é uma questão muito triste. Mais triste se torna quando os comentários a estes assuntos destilam inveja (que não é o caso, mas permite-me o desabafo :)). Uma pessoa que vem "de baixo" e chega a médico ouve muita coisa, de muito lado. (se conseguires ler este comentário até aqui és um valente! isto ficou um testamento :P)

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    1. Li tudo o que escreveste, com certeza. E é como tu e eu dizemos: a culpa não é de uns nem de outros. É de ambos os lados. Claro que se está a falar numa generalização mas, infelizmente, é uma generalização que não é difícil de ser feita, especialmente no meio que eu conheço, pelo menos.
      É preciso as pessoas começarem a abrir os olhos. Quem presta vassalagem que deixe de o fazer e quem tem vassalos que diga que isso não faz o mínimo sentido.
      Toca a ser um bom exemplo da classe, Cris! :)

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Aceitam-se pires de amendoins.