terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Terço

"O teatrinho das "aparições" serve assim para trazer de volta a reza diária do terço, uma fórmula com tudo de paganismo religioso. Com a qual as pessoas que a reproduzem pensam, tal como os pagãos, que é no seu muito repetir as mesmas palavras, como uma cassete, que obtêm do seu Deus todo-poderoso, como o padrinho de uma grande máfia, a satisfação dos seus egoísmos individuais, familiares e corporativos. E não é que, cem anos depois, a reza do terço continua ainda a ser o que mais se realiza em Fátima, puro paganismo, pura alienação, pura beatice, nenhuma espiritualidade transformadora do ser-viver das pessoas e das sociedades?! Uma humilhação de todo o tamanho, que deveria envergonhar os clérigos que, com a sua presença em grande número, mas sempre bem à parte e bem acima das multidões e rodeados de honras e de privilégios, continuam a dar cobertura a toda aquela pantomina sem pés nem cabeça. Um vómito sagrado, milhões de vezes repetido, ao longo de cem anos, num país e num continente cada vez mais egoístas, insolidários, corruptos, exploradores, sem quererem saber das pessoas mais fragilizadas para nada. As quais, assim, ficam cada vez mais entregues à sua solidão e ao seu abandono, piores do que os cães e os gatos de estimação... Mas àquela imagem da senhora de Fátima é que não pode faltar nada, nem velas a arder dia e noite, nem clérigos, nem freiras, nem multidões humilhadas e carentes de tudo, nem dinheiro e ouro em quantidades inimagináveis, nem flores, nem andores, nem basílicas, nem bugigangas de recordação, nem sangue, nem lágrimas, nem gente a rastejar e ajoelhada, num sadomasoquismo de arrepiar..."

in "Fátima, S.A.", do Pe. Mário Oliveira

3 comentários:

  1. "...puro paganismo, pura alienação, pura beatice, nenhuma espiritualidade transformadora do ser-viver das pessoas e das sociedades?! Uma humilhação de todo o tamanho..."

    Generalizar é sempre um grande erro. Primeiro, porque se incorre sempre no risco de se cair em mentira. Segundo, porque não se conhece nunca a generalidade. Terceiro, porque a visão de uma pessoa não fala pelas reais crenças e sentimentos e perspetivas de tantas outras. Podes até achar que "a beatice" do terço não tem nada de transformador; mas se calhar, por esse país fora, encontras muita gente que o faz e sente de maneira muitíssimo diferente dessa que descreves.
    Ter opinião é ótimo. Meter tudo no mesmo saco, uma asneira.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Caro Anónimo,
      O texto que apresento não é da minha autoria, como deves ter reparado. E nem sequer teço comentários sobre o mesmo. Foi colocado aqui apenas como food for thought. Generalização é, de facto um erro.
      No meu caso pessoal, o que me despertou atenção neste texto foram duas questões essenciais no que toca à minha opinião sobre crenças religiosas, nomeadamente a crença religiosa católica:
      - o paganismo: porque a devoção a santos e santas não é mais do que o equivalente à adoração pagã de ídolos. Devoção essa que é negativamente julgada na Bíblia cristã.
      - a alienação: que acaba por se relacionar com o ponto anterior, porque os próprios religiosos fazem o que a base da sua religião diz para não se fazer, bem como se prestam a rituais de culto que, descritos a um ser humano isolado, podem perfeitamente soar a ritual satânico (temos milhares de pessoas de joelhos a entoar repetidamente palavras rituais, adorando o corpo e o sangue de alguém, rodeados de velas e fumos com cheiros).
      - a beatice: que vem dos dois anteriores, porque uma crença não crítica dos seus rituais (sendo que crença e ritualização prática da crença são coisas que não precisam de estar relacionadas) não será mais do que beatice.

      Com estes três pontos, não coloco em causa os efeitos da fé, nem as boas intenções que as pessoas podem ter com ela, nem as boas acções que ela pode gerar. O que não se pode ignorar é que estes três pontos, começando no primeiro e seguindo a lógica para os outros dois, não pode não ser generalizada, quando estamos perante um ritual anual de peregrinação e adoração.

      - e ainda a última frase do transcrito, que creio que fala por si.

      Eliminar
    2. P.S.: E o texto não representa totalmente a minha opinião, tampouco todo o texto criado pelo autor na sua obra.

      Eliminar

Aceitam-se pires de amendoins.